Transformação e setores impulsionam o avanço

Transformação e setores impulsionam o avanço

O crescimento de dois dígitos é extremamente atrativo. A expansão do patrimônio gerido reflete valorizações e novos investimentos. Todos desejam se beneficiar dessa ascensão, e a digitalização potencializa o setor.

Em Portugal, o patrimônio sob gestão dos organismos de investimento coletivo mobiliários (OIC mobiliários) ultrapassou 24.400 milhões de euros em 30 de setembro de 2025, conforme dados da Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Patrimónios (APFIPP). Isso representa um crescimento de 17,3% desde o início do ano e de 21,1% em relação ao ano anterior, impulsionado por fortes entradas líquidas de capital e valorização dos ativos. Somente em setembro, as novas subscrições ultrapassaram 825 milhões de euros, resultando em um saldo líquido positivo de quase 500 milhões, o maior ganho mensal desde 2021.

O contraste com o desempenho dos anos anteriores é evidente. Em 2024, o setor teve uma expansão mais modesta: em março daquele ano, o total era de 19.077 milhões, apenas 7,2% acima do que foi registrado em 2023. Em um período de dois anos, o mercado português praticamente duplicou seu ritmo de crescimento patrimonial e consolidou uma tendência de captação que se sustenta apesar da volatilidade internacional. Essa aceleração é ainda mais significativa dado o contexto europeu exigente. Ao final de 2024, os organismos de investimento coletivo em valores mobiliários (OICVM) da União Europeia geriam 15,3 trilhões de euros, um aumento de 16% em relação ao ano anterior, após um 2022 marcado por perdas expressivas devido à alta inflação. Países como Alemanha, França e Luxemburgo, que detêm a maior parte do patrimônio europeu, registraram crescimentos próximos de 10% em 2024, mas ainda distantes do ritmo português deste ano. A Irlanda, onde muitos fundos internacionais estão domiciliados, cresceu 12%, enquanto a Espanha ficou abaixo de 9%, afetada por resgates líquidos em fundos de obrigações. Comparativamente, Portugal se aproxima dos mercados europeus intermediários, combinando crescimento patrimonial com uma base digital em rápida expansão.

Crescimento digital
Nesse contexto, a digitalização e os exchange-traded funds (ETFs) desempenham um papel crucial. “Os ETFs transformaram o panorama do investimento global, democratizando o acesso a mercados que antes eram quase exclusivos de profissionais ou grandes investidores”, explica André Themudo, diretor da BlackRock em Portugal.

Um terço dos investidores portugueses já possui ETFs, e a base de usuários deve crescer 54% nos próximos meses, segundo o relatório People & Money da BlackRock. O estudo ainda ressalta que Portugal se destaca na digitalização do investimento, com 87% dos investidores acessando ETFs por meio de plataformas digitais, equivalente aos índices do Reino Unido e superior a países como Dinamarca (86%) e Países Baixos (82%). Esse indicador, normalmente associado a mercados mais desenvolvidos, sugere que a digitalização em Portugal está encurtando a distância em relação aos centros financeiros europeus.

“O mercado português apresenta um elevado potencial de crescimento no segmento de ETFs”, embora a falta de educação financeira e a percepção de que é necessário “um investimento considerável” ainda limitem a adesão, aponta André Themudo.

O avanço digital impacta diretamente a estrutura do mercado nacional. As plataformas de investimento e poupança digital — muitas delas ligadas a bancos ou gestoras internacionais — facilitaram o acesso a produtos diversificados, reduzindo o custo médio e aumentando a concorrência entre gestoras. Paralelamente, o número de fundos disponíveis e a diversidade de temáticas cresceram. Em setembro, foram registrados seis novos fundos na APFIPP, incluindo produtos de obrigações europeias e carteiras multiativos. Contudo, os fundos de poupança-reforma (PPR-fundos) continuam a liderar o mercado, com mais de 4.700 milhões de euros sob gestão no verão de 2025, seguidos pelos fundos de obrigações em euros e de curto prazo.

Apesar do dinamismo, o setor enfrenta desafios. Em 2024, quase 90% dos fundos nacionais superaram a inflação, mas menos de um terço conseguiu superar seu benchmark (índice de referência). A gestão ativa, onde gestores escolhem individualmente as empresas ou títulos, enfrenta crescente concorrência de produtos passivos, que são mais baratos e previsíveis. Em um cenário onde as taxas de juros estão caindo mais lentamente do que o esperado e os mercados acionários europeus acumulam ganhos moderados, o investidor português começa a exigir consistência, além de crescimento em volume.

Mais concorrência

A médio prazo, o caminho parece traçado. Portugal reforçou sua base de investidores e ampliou o mercado de fundos mobiliários a ritmos acima da média europeia. Contudo, a solidez desse crescimento dependerá da habilidade das gestoras em combinar inovação digital com rentabilidade sustentada e custos competitivos. O risco é evidente: se o investimento ativo não conseguir justificar as comissões, os ETFs continuarão a ganhar espaço.

O mercado nacional está, assim, passando por uma transição estrutural. A poupança está migrando de produtos tradicionais para fundos e ETFs, a digitalização democratizou o acesso e a concorrência está se tornando mais europeia. O desafio decisivo será transformar a atual expansão em um ciclo duradouro de criação de valor — onde a educação financeira, uma regulação estável e a transparência determinarão quem lidera o próximo capítulo. “Os ETFs não são uma moda; são uma mudança estrutural”, afirma Themudo. E Portugal, pela primeira vez em décadas, parece ter a oportunidade de estar entre os primeiros a se adaptar a essa transformação.

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